sexta-feira, 2 de maio de 2008

um testemunho

É verdade! De facto, em variados aspectos, para mim o curso está a ser uma aventura bem prazeirenta. E porque às vezes arrependo-me por calar, ( claro que noutras arrependo-me por falar), convem dizer, sem um certo tipo de pudor paralizante, que sinto-me privilegiado por fazer parte deste grupo. Gosto da sua heterogenidade, inspiram-me as opiniões de cada um (quer concorde ou não), enternece-me os seus silêncios. Talvez, de uma certa forma, sinta segurança com a diversidade sugerida. Sei que é curto este tempo em conjunto, na medida em que o que possa aprender com a nossa dedicada formadora e com as experiências de cada um dos meus colegas é apenas um pequena gota das várias águas que seria possível beber dentro de um grupo como este.
Isto afinal, para responder que gostaria de expandir o curso para as sessões que forem possíveis, conforme falado na última aula. (Nas quartas feiras de preferência).

Outra coisa é este blog. Cumprimento aqueles que já escreverem, e desafio aqueles que por qualquer tipo de inibição ou receio de exposição ainda não participaram.
Partilho então um pequeno texto que tenho na "gaveta", pretendendo tambem dar o meu testemunho sobre as mil e uma caras (e máscaras) do poema.

Deixaria ainda uma sugestão: Alem de analisarmos poemas da Ana Luísa Amaral ( o que ficou por fazer na última aula), atrevo-me a sugerir, quem sabe, a discutir um dos poemas, que de certeza, cada um de nós tem guardados num local secreto. Afinal uma "oficina de escrita criativa" tambem passa por aí. Concordo que não é possível ensinar a escrever, mas é crucial entender aquilo que não resulta e não deve ser seguido ou aquilo que está a mais. E quem sabe salientar algum verso ou sentido que produza um efeito relevante ou sentido poético.
Não sei! é uma ideia. Pela minha parte não fico melindrado com as críticas, aliás ficaria agradecido de as receber. Acho mesmo que me é vital nesta fase de aprendizagem.

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AQUELE BEIJO

Aquele olhar não é triste
É o meio de amansar um desejo.
Triste é não acreditar
Que merece aquele beijo.

Um beijo não é um prémio
Tão pouco uma aprovação
São duas bocas
São dois lábios
São duas da tarde
E o Senhor Juiz esta almoçar
Não tinha nada que provar,
A não ser...
Aquele beijo.

A saliva animal do desejo dele
Cola na nitidez do desejo
Brilhante da quase carne
Dos lábios dela.
-Como é seguro o seu aroma.
Pensou ele de olhos fechados,
E beijando-a
No escuro
Abriu-se a porta do estábulo,
E beijando-a
Ao sol
Viu a ossura do cavalo a correr
Livremente.

O amor estava lá
Mas não se falava dele.

4 comentários:

M. disse...

Olá António,

(ou devo chama-lo José? ;)

Gostei da ideia de analisarmos poemas da gaveta. Para quem não tem problemas em revelar o que escreve os comentários serão aprendizagem. Para mim que tinha (tenho) pavor de mostrar o que escrevo (medo da crítica? medo de me expôr? medo de saber de uma vez por todas que não escrevo bem?...não sei, tenho pensado nisso) os tpc têm servido para desbloquear. E a ideia de mostrar algo guardado é mais um desafio. Às vezes penso que é como se ali naquele espaço (ou aqui neste espaço) tudo fosse permitido.
Por isso concordo e acho uma bela ideia a sua. Assim como foi uma bela ideia a do Renato de analisarmos poemas. Nunca veria por meus olhos a mesma beleza na magnólia.

E gostei muito desse beijo que me pareceu quase existir em paralelo com o cavalo que correu em liberdade no final. Como se inicialmente o prender do desejo, fosse comparável ao prender do próprio cavalo no estábulo. E o desejo domesticado fosse o momento do beijo que saiu a correr num galope livre e leve com a serenidade do sentimento concretizado. Se calhar é uma interpretação enviezada, mas foi a que se me apresentou quando li.

Obrigada por partilhar connosco.

Joana disse...

Também gostei muito!
Fez-me pensar na contradição entre o juiz que prende, normalmente, e o cavalo que corre livre. O amor, e o beijo, também, parece andar sempre entre esse cá e lá...
Gostei muito dos dois últimos versos, mas para esses não tenho palavras!
Obrigada António.

A. Roma disse...

Só mesmo para agradecer os comentários e a generosidade.
Espero ler poemas vossos, aqui ou ali, tanto faz, e retribuir uma análise. Irão ver como é interessante receber uma opinião daquilo que escrevem, de alguem que ama a poesia. Foi o que eu senti!

Marlene,
Entendo (e partilho) o seu pavor, mas se calhar, que sei eu?, se calhar...está na hora! afinal mais um passo, dos muitos para chegar até Ítaca. E já deu para ver que não sabe escrever mal.

Joana,
Delicioso detalhe final, o seu.
Na verdade tenho a sensação que tem muito para dizer e pode ter a certeza que um cavalo alado(um primo de musa) anda, de mansinho, a resgatar para a liberdade as palavras que já são suas.

Desculpem-me as liberdades. Custa-me ser de outra forma.

Joana Espain disse...

Viva

Gostei especialmente do olhar disfarçado, 'Aquele olhar não é triste.É o meio de amansar um desejo.', e das curvas e desníveis do poema.